FERNANDO BOTERO (Colômbia)
(A)TEMPORAL
No seu tempo havia tudo do seu tempo, de outros tempos também havia, mas disso poucos tinham consciência, porque, no seu tempo, a terceira pessoa do pretérito perfeito do indicativo do verbo passar tinha uma conotação diferente da de hoje, aliás, este verbo já não existe, isso porque, hoje, de nada mais se diz que "passou", justamente porque passa tão depressa que ninguém percebe; de nada se tem saudade, lembrança nenhuma, esta é uma Era de solidão, de urros e mur®os, de membros cuja paridade é a da ruindade extrema, do mais exacerbado egoísmo, que o mundo mudou de fato para melhor e para pior, no qual episódios podem ser encomendados com qualquer antecedência, principalmente se urgente for a encomenda, o pedido sai no mesmo instante, e logo estarás com a arma do teu premeditado crimezinho de pulha, com a tua pífia organicidade dando peidos, a pressão alterada por tanta agonia à espera da felicidade de cravar no Outro o que ele mereça, é isso: no seu tempo as coisas iam de seixo a pior, artimanhas demoravam a ser trançadas, como um croché ou tricô finamente elaborados, e que por isso mesmo requeriam um tempo maior, mais dilatadas as narinas do cão, mais inchados os colhões e arada a tara da potranca, a vapor ia o mundo, na flauta, mas hoje o buraco é noutro lugar, nada de ser mais embaixo, porque hoje tudo é up, warm up, tempo de lingeries folheadas a ombros de desfaçatez sem fim, as terras do sem fim continuam sendo uns quilos de carne, ou seja, pulsares descartáveis e hipotéticos quasares de cama & mesa. Juste pour rire / just for laughs / só rindo... em vários idiomas, em todos.
Texto: Darlan M Cunha / Arte: Fernando Botero
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