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FERNANDO BOTERO


Pois o mundo é roda viva, e enquanto fatos apenas ameaçam serem fatos, uma moça deita-se com um livro, e aborda com ele uma dúvida, uma quase certeza, uma certeza, porque a moça, de dentro e do alto da sua monumental solidão, quer mais do que apenas pentear cabelos, muito mais do que somente beliscar o pão que sobre a mesa sorri para ela, quer mais do que perceber que o vizinho deu um tiro pela culatra, que os documentos não ficaram prontos, que a correspondência está atrasada, ora, a moça não quer, de jeito nenhum, ficar nua impunemente. É isso: o natural parece estar cada vez mais distante, e assim ela revira os poros e os olhos do livro, à procura dos próprios olhos, já quase tão descrente e demente quanto o próprio mundo lá fora, que o seu mundo começa nalgum lugar ainda indefinido, ainda sem encontro marcado com o plantador.

Texto: Darlan M Cunha

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Barreiro - BELO HORIZONTE, MG * Todos fogem, querem mudança em sua mesmice, novos degraus com textos e tetos, de um modo ou de outro, sentem que a vida é minuto, frutas murcham depressa, animais logo estão cada vez mais sisudos e mal-humorados, e assim chegam às monstrópoles, às suicidades. * Darlan M Cunha  

calmaria

  Uma calmaria aparente dentro da aldeia, sobre ela uma zanga de nuvens - mas não se deve levar nuvens a sério, por inconstantes - sina - e levianas feito dunas e seixos escorrendo e escorregando daqui pra lá, de lá para além-lá, feito gente nos seus melhores e piores dedos, entraves, momentos, encontros e despedidas. Um gotejo aqui e ali, mas outro tipo de gotejo num lugar da casa vai trazendo à cena o verso do português Eugênio de Andrade (Prêmio Camões 2001), decifrando a lágrima: " a breve arquitetura do choro ." Darlan M Cunha
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